23 de nov. de 2010

Paul McCartney - 21/11/2010 - Estádio do Morumbi - SP

O que dizer a respeito do show mais esperado da minha vida?
Na última vez em que Paul McCartney esteve no Brasil (93), eu tinha 14 ou 15 anos...o que provavelmente fez dessa a minha única oportunidade de assistir a mais um show que mudaria minha vida.
Quem me conhece sabe que eu gosto de rock. Do básico ao metal, rock faz parte da minha vida. E saber que eu iria ao show do Paul McCartney mudou minha semana...
Já na segunda-feira eu estava ansioso, pensando em que músicas eu iria ouvir (e nas que eu provavelmente nao ouviria). Pensei em como eu gostaria de assistir esse show na companhia do meu pai, que me ensinou a ouvir Beatles. Nostalgia era pouco, pois essas músicas fizeram, e ainda fazem, parte da minha vida.
Eis que lá estávamos, disfarçando a ansiedade, conversando sobre o tudo e sobre o nada. Quaisquer motivos faziam o povo olhar atentamente para o palco, como se uma aparição divina fosse surgir no palco. O telão passou a exibir, cerca de 20 minutos antes do início efetivo do show, fotogramas que contavam a história de Paul McCartney, que nada mais eram do que a história da música pop do último século.
Eis que as luzes do palco se apagaram, aquele senhor de 68 anos surge correndo com uma vitalidade que muitos caras de 20 anos não possui, sauda o público e lança os primeiros acordes de Venus and Mars. Foi dado início a magia.
Eu me propus a marcar o tempo de show, já que noticiaram que o show duraria cerca de 3 horas. Venus and Mars foi emendada com Rock Show, clássicos de McCartney com o Wings, acompanhadas de perto por outro clássico da banda, Jet.
Mas, quando Macca conversou EM PORTUGUÊS com os "PAOLISTAS" e, com seu tradicional Hoefner em punho começou a estrofe "Close your eyes and I'll kiss you...", o Morumbi veio abaixo.
Fica evidente que Macca sabe o poder de fogo que tem em mãos. Ele sabe que é dono de vários hinos do rock e do pop que mudaram a história e o curso da música. Ele tem, em meros 15 minutos de show, o jogo completamente ganho. Mas ainda iria estabelecer a goleada.
Mesclando clássicos da carreira solo, com músicas de sucesso do Wings e, claro, sucessos dos Beatles, Macca conquistava a platéia não apenas com a música, mas com sua simpatia. Ele brinca, conversa, acena, faz gracejos, dança, acena novamente, faz mímicas e canta. E como canta. Ninguém se dá conta de que aquele senhor possui 68 anos. Ninguém se dá conta de que ele não pára. As músicas são executadas exatamente no mesmo tom em que foram gravadas originalmente, ou seja, perfeitas!
Depois de classicos absolutos, como Drive My Car, Let Me Roll it, The Long And Widing Road (minhas primeiras lagrimas), I've Just Seen a Face, And I Love Her, Blackbird e outras, McCartney aparentemente resolveu incendiar a plateia e vencer, por goleada, um jogo que estava ganho desde o inicio das vendas de ingressos.
Dance Tonight, tirada do seu último disco de inéditas Memory Almost Full, divertiu a plateia com uma curiosa dancinha do excelente Baterista Abe Laboriel Jr. Possivelmente foi o primeiro momento para muitas pessoas notarem alguém diferente de Paul no palco, o que foi um pecado, pois a banda que ele trouxe é extremamente competente. Após Eleanor Rigby, veio a já manjada homenagem a George Harrison, em que ele toca Something inicialmente no Ukulele e depois é acompanhado pela banda no arranjo original da música (mais lágrimas, em quantidade vexatória dessa vez).
Sem poupar a platéia de êxtase, o set list a partir de Band on The Run foi impecável.
Aliás, é muito comum ler por aí críticas a Ob-La-Di Ob-La-Da. Macca deve saber disso. E mais, ele deve saber exatamente o propósito da música. Do lugar em que eu estava na pista, nenhuma música foi tão festejada quanto essa. As pessoas dançavam, pulavam, brincavam, sorriam. Ob-La-Di Ob-La-Da não é infantil como Yellow Submarine. É divertida. É uma canção de amor pop com final feliz. E explicou sua existência ali.
Aos 68 anos, Macca pega pesado como poucos com Back In The USSR, I Got A Feeling e Paperback Writer. A galera roqueira ia ao delírio. Antes do primeiro descanso, quase duas horas depois do início do espetáculo, Macca ainda tem a manha de homenagear John Lennon com a dobradinha A Day In The Life/Give Peace a Chance, seguidas de Let It Be (com fogos de artifício), Live and Let Die e Hey Jude.
Ele pára. A galera sauda. Em dois minutos (Deus, ele tem 68 anos... Nem mesmo eu com 32 descanso com apenas 2 minutos!) ele volta. E manda Day Tripper.
Fica evidente que ele sabe o que está fazendo. Ele tem a manha. Ele sabe que a galera está lá por isso. E passa a emendar pérolas do rock uma atrás da outra. Pepitas que não nos cansaremos nunca de ouvir em nossos MP3 Players, imagine então estas sendo executadas "organicamente" ali, a poucos metros de distância de você...
Alguns minutos depois ele pára novamente. Mas, aparentemente, não é Paul quem se cansa, mas a banda. Ele volta, sozinho, e toca Yesterday, talvez seu maior feito (mas certamente não o melhor nem o único feito) para a música pop. Era o aviso de que o show estava chegando ao fim.
Ele agradece, exibe simpatia pela enésima vez, agradece a banda e a platéia. E pega pesadíssimo com Helter Skelter. Toda a história do rock passa a fazer sentido.
O final, apoteótico, é com Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band e The End. A letra de The End ("And in the end/The love you take/Is equal to the love you made" - E no final/O amor que vc recebe/É igual ao amor que vc oferece) faz todo sentido. Lágrimas. Muitas lágrimas. É impossível conter a emoção. É impossível não pensar no quanto tudo aquilo fez sentido. Naquele momento eu pensei no meu pai (que me ensinou a ouvir Beatles), na minha mãe (que me deixou gostar de Beatles!), nos meus amigos (que ouvem Beatles comigo), na minha esposa (que casou comigo ao som de Beatles)... Enfim, por mais que pareça lugar comum, uma parte de mim se completou.
No dia seguinte, tudo parece um sonho. É difícil descrever o que foi o show para quem não esteve lá.
Para quem viveu nos anos 60, ou para quem viveu o show de Paul McCartney no Morumbi, o sonho não acabou. E nunca irá acabar.


SETLIST
"Venus and Mars / Rock Show"
"Jet"
"All My Loving"
"Letting Go"
"Drive My Car"
"Highway"
"Let Me Roll It / Foxy Lady (Jimi Hendrix cover)"
"The Long and Winding Road"
"Nineteen Hundred and Eighty-Five"
"Let 'Em In"
"My Love"
"I've Just Seen A Face"
"And I Love Her"
"Blackbird"
"Here Today"
"Dance Tonight"
"Mrs Vandebilt"
"Eleanor Rigby"
"Something"
"Sing the Changes"
"Band on the Run"
"Ob-La-Di, Ob-La-Da"
"Back in the U.S.S.R."
"I've Got a Feeling"
"Paperback Writer"
"A Day in the Life/Give Peace a Chance"
"Let It Be"
"Live and Let Die"
"Hey Jude"

bis
"Day Tripper"
"Lady Madonna"
"Get Back"

bis
"Yesterday"
"Helter Skelter"
"Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band/The End"